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Eu não me recordo de quem começou. Terá sido ela, terei sido eu, ou terá sido a mãe dela? Já não importa. Em retrospectiva, foi a melhor coisa que podia ter sucedido. Graças a deus pela retrospectiva!

6 anos antes daquele dia, nós tínhamo-nos casado. Foi um casamento simples nos arredores de Évora, de onde ela era. Uma verdadeira alentejana, daquelas que só ouvimos falar na cultura popular. Incrivelmente bela, olhos como a noite, com umas curvas perfeitas. Não estou a brincar.
Forte e determinada. Sempre a culpar os outros, mas compensava com o seu charme e beleza.

Foi um dos melhores dias da minha vida. Na minha mente fica apenas atrás do dia em que nos divorciámos.

É interessante e engraçado verificar que quando um casamento se rompe, de repente as pessoas começam a falar de mobília, objectos, coisas que são minhas, coisas que são tuas. Levar as coisas, guardá-las, deitá-las fora, ou armazená-las. Encontrar uma garagem, encontrar um espaço, serviços de mudança. Começa a contagem decrescente! Caixas, fotografias, cartas. Quem fica com o quê?

Ganância que aparece do nada onde previamente havia generosidade e amor. As discussões brotam de todo o lado, na casa de banho, na cozinha, no quarto, à porta, no carro, na garagem, não importa o espaço; se estávamos a menos de 3 metros um do outro, discutíamos. E mantinham-se estas discussões totalmente absurdas, que eram sobre tudo e mais alguma coisa, chegando até ao mais ínfimo detalhe que de outra forma seria completamente invisível para nós ambos. Interessante.

Subitamente descobrimos um apego há muito esquecido por coisas que nos foram dadas pelas nossas mães e avós, antigos amores ou amigos que não víamos há anos e que praticamente já nem eram amigos propriamente ditos. -Isto é meu! A minha mãe ofereceu-me! -Nem pensar! Comprei isto no Natal em 2014. Nem sequer gostavas disto. -Ah!

É uma espécie de negociação emocional estranha que acaba por saturar toda a gente, mas é um processo necessário na separação. E não há nada como coisas materiais para acelerar a separação do resto, dos aspectos mais importantes.

Tudo isto para dizer que ela ficou com a casa. Eu não me importei. Afinal de contas, eu queria viajar de qualquer maneira, e libertar-me da responsabilidade da casa não era algo mau. Eu só precisava de encontrar um local para arrumar as coisas que consegui ganhar na batalha. Ela não as queria na casa nem na garagem que eu próprio tinha construído. E para ser sincero, eu também não queria lá ter essas coisas arrumadas.

Comecei então a procurar freneticamente um espaço para arrumar todas as coisas com as quais tinha ficado. Um espaço para arrumações! Nunca tinha pensado sobre isto antes. Teria me visto livre de tudo se pudesse, mas algumas coisas, como se pode calcular, tinham um enorme significado e valor emocional para mim. Eu não as queria danificadas ou arrumadas numa arrecadação suspeita. Mini-armazém, grande armazém, eu não queria saber. Simplesmente não me fazia sentido deixar as minhas posses pessoais num sítio que se pareça um armazém para guardar tralha. Uma box! Uma box? Eu não quero deixar as minhas coisas numa ‘box’! Em circunstância alguma! Preferia deitá-las fora.

Perguntei por aí e ninguém tinha um pouco de espaço para guardá-las. Perguntei a amigos e vizinhos, membros da família e até conhecidos, mas eu tinha muitas coisas; alguns objectos eram grandes peças como a televisão ou o sofá, também tinha muitas peças de arte penduradas nas paredes, e ninguém tinha um espaço grande o suficiente ou nem mesmo uma garagem onde tudo coubesse.

Isto foi quando o verdadeiro desafio começou. Gastei um dia a fazer telefonemas e a procurar online por um armazém para alugar, e acabei por encontrar um par deles mesmo aqui em Lisboa. Não pensei que este serviço existisse de facto em Portugal, mas às vezes vive-se numa bolha enquanto o mundo continua a rodar.

Procurei em todo o lado e apenas encontrei “boxes”. As empresas de self-storage estavam a auto-intitularem-se de boxes. Isso não me soava bem. Não. Uma box não é algo onde eu goste de imaginar que estão as minhas coisas. Não o meu sofá nem as minhas peças de arte. Eu precisava de outra coisa qualquer, algo mais elegante, mais cuidadoso e mais humano. Algo que não se parecesse com um armazém com um pequeno balcão de recepção e um tipo desleixado ou uma mulher vulgar de saltos altos sentada atrás do balcão.

Graças à minha pesquisa, encontrei um tipo diferente de empresa. Eles chamavam-se a si mesmos de Kuboo, e aos seus espaços chamavam de kuboos. Logo aí, notei imediatamente a diferença. Diziam que eram um hotel-boutique para arrumações.

Não eram apenas simpáticos, eram mais do que isso, eram atenciosos. As instalações não se parecem com as das outras empresas, parecem de facto um hotel-boutique. Casuais, maravilhosamente concebidas, as mais limpas que se possa imaginar, cheias de luz e com kuboos que dão a sensação de um ambiente mais pessoal.

E depois têm o staff. Um conjunto de pessoas reais, que nunca me tentaram vender nada, escutaram cuidadosamente as minhas necessidades e acompanharam-me em todo o processo até encontrarmos a melhor solução disponível. Alugar um espaço na Kuboo, um espaço chamado kuboo, pareceu-me bem melhor do que alugar uma box num lugar chamado space.

As minhas coisas têm lá estado arrumadas há já 2 anos, eu tenho andado a viajar pelo mundo sem parar, e nunca mais me preocupei com isso.

Isto é o que realmente sucedeu no meu conto inventado. Se acredita ou não, é consigo.